... da totalidade das coisas e dos seres, do total das coisas e dos seres, do que é objeto de todo o discurso, da totalidade das coisas concretas ou abstratas, sem faltar nenhuma, de todos os atributos e qualidades, de todas as pessoas, de todo mundo, do que é importante, do que é essencial, do que realmente conta...

Em associação com Casa Pyndahýba Editora
Ano III Número 38 - Fevereiro 2012

Crônica - Cesar Cruz

Miyamoto Musashi having his fortune told. Print by Utagawa Kuniyoshi
O meu Feiciharakiri

De repente me dou conta de que preciso ser sincero, não tanto aos meus princípios, mas mais às minhas irritações. Tentei tirar no bom humor o mau humor que o Feicibuqui me causa. A dúzia de amigos que leu meu último livro, suponho que tenha lido a crônica O Feici e o Guma, em que falo sobre essa superficial e fugaz forma de amizade.

Tentei tirar no humor, mas confesso que meu azedume, provocado pela irritabilidade oriunda da idade que me encontro, me impede.

O Feicibuqui e tudo o que ele representa me aborrece de maneira muito especial. Sou um rabugento confesso. Não suporto aquele ambiente da superficialidade e egocentrismo. A ferramenta "curtir" é a concretização cibernética da hipocrisia moderna. A pessoa curte , mas sem saber o que curtiu. É a média (e não mídia) digital.

Sofri um acidente, um pequeno acidente, mas que serviu como divisor de águas, como um momento de reflexão, como lente de aumento que me fez enxergar e pensar no que representa de fato uma rede como aquela.

Escrevi uma crônica sobre o meu acidente e a postei diversas vezes no Feicibuqui, no intervalo de 7 dias. Cerca de 15 vezes no total. Duas dezenas de pessoas "curtiram" a minha desgraça, sem ao menos ler, pois se tivessem lido teriam comentado. E não curtido. Curtiram o quê, ô caras pálidas? Algo que nem leram, né? (Assim como também não lerão isto que escrevo agora).

Vamos ver quantos vão curtir este texto, sem ao menos ler. E isso é cômico ou trágico? Não sei responder. Alguém aí que responda por mim.

Houve uma meia-dúzia de pessoas que leram aquela postagem do meu acidente, sim. E essas, claro, comentaram o ocorrido. Afinal, um acidente com o amigo...

Mas analisemos: tenho 520 amigos ali no Feicibuqui? QUINHENTOS E VINTE!

Percebeu o absurdo? É a solidão em meio à multidão. Alguém já escreveu sobre isso.

Do que serve o Feicibuqui, afinal? Para se fazer amigos? Não se faz amizade assim, acabo de provar.

Então, para se manter amigos? Ora! Os meus amigos são amigos com ou sem Feicibuqui. Naquele ambiente superficial não se mantém coisa alguma, muito menos amizades, sejamos sinceros.

Para se entreter, então? Mas se entreter com o quê? Com o diário de "pequenezas" que as pessoas postam ali a cada 5 minutos? "Fui na feira, tô no trânsito, meu filho fez cocô, um pernilongo picou minha bunda, almoço na minha irmã, fui sei lá onde..." É isso? É essa espécie de diário aberto da vida dos outros que usamos para nos entreter? Essa enxurrada de nada, e que sobressai às isoladas tentativas vãs, de alguns poucos, em trazer à luz qualquer assunto de maior relevância e conteúdo mais robusto?

Estou fora. Permanecer ali seria uma luta inglória contra tudo o que eu não acredito. E pior: seria concordar. Não tenho mais paciência pra forjar esse aço frio. Me sinto irritado e sem forças.

Não me acrescenta em nada, o Feicibuque. O tempo que dedico a ele, dedicarei a ler mais livros, a navegar pelos sites interessantíssimos que há na Internet, conversar com os amigos, enfim... a vida é curta para ser pequena, como garantiu Disraeli.

Bem, argumentam que o Feicibuqui serviria para se divulgar algo para uma plataforma grande de pessoas. E serve? Não serve. Provei isso também. No lançamento do meu último livro, depois de uma louca e intensiva divulgação que fiz ali, durante dois meses, recebi o mesmo número de pessoas na tarde de autógrafos que recebi na do primeiro livro, quando eu nem ao menos tinha Feicibuqui.

Aquele é o ambiente onde impera a comunicação genérica e rala, o entretenimento oco. É a vitória da aristocracia do vazio, que incrivelmente ainda (e mais do que nunca) faz tantos adeptos: é o BBB, a Luisa do Canadá, o Michel Teló, e o diário de efemeridades cotidianas de cada um, e tudo o mais (ou menos) que possa vir por aí...

Me desculpe quem gosta. Não é nada pessoal. É apenas um modus vivendi que não quero mais contribuir para fomentar.

Ah, sim, conheci pessoas legais ali, isso de fato ocorreu. Pessoas que foram apresentadas a mim por outras pessoas legais que já eram minhas amigas antes do Feicibuque, mas que, pensando bem, me seriam apresentadas de qualquer maneira, por intermédio do meu blog, do meu email, do meu telefone... Então, nem pra isso o Feicibuqui serve.

Sim, sim, admito. Estou amargo, cinzento e ranzinza, começando um 2012 duro e desanimado. Talvez seja isso mesmo...

O fato é que minha presença, e as coisas que escrevo fazem mal aos animadíssimos feicibuquers. Ou pior: não fazem nada, já que ninguém lê nada daquilo que ninguém escreve e que se apresente mais espesso e profundo que uma polegada.

Dispenso figurar nesse palco. Por favor, não me curtam.

Dou aqui e agora o meu grito de NÃO a essa forma moderna de relacionamento. Como um protesto, paro amanhã no fim do dia de Feicibuquear. Faço, convicto, o meu feicisuicídio, o meu feiciharakiri.

Alguns dirão para que eu não faça isso, pois, como quem se mata, posso me arrepender.

Sim, posso. Porém, teimoso (se eu não fosse teimoso não seria escritor no país do BBB), farei assim mesmo.

Continuarei aqui na Internet, para os que gostam do que escrevo, que sabem que podem me achar pelo meu blog: www.oscausosdocruz.blogspot.com, trocar ideias comigo através do meu email: cancruz@terra.com.br, me telefonar, passar em casa, me encontrar na padaria pro café...

E quanto a você, que tem Feicibuqui, aproveite para avaliar quantos dos meus 520 amigos vão curtir, ou verdadeiramente acessar, aquela postagem.

Tchau.

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